sábado, 22 de março de 2008

Análise caseira

Durante todos estes meses que não vimos dois casais amigos que moram longe, imaginei o reencontro entre os nossos três filhos da mesma idade, temendo diferenças notórias. Os outros dois, além de considerados normais, começaram a dizer as primeiras palavrinhas muitíssimo mais cedo. Tentei olhá-los com imparcialidade milimétrica. O que eu vi, muito honestamente, foi que ambos falam, socializam, riem e brincam menos do que o meu filho. Do primeiro nem uma palavra. Ainda brindou o meu filho com uma sova despropositada porque não quis partilhar os brinquedos que, só por mera coincidência, até eram do meu filho. O meu marido ainda tentou entabular conversa mas foi pura e simplesmente ignorado. A única vez que lhe ouvimos a voz foi para o ouvir dizer o nome, seguido de uma pequena discussão para o ar, de dedo em riste, numa linguagem que ninguém entendeu. Sabemos, no entanto, que no quotidiano se expressa muito melhor. Em contexto social levaria nota zero e um diagnóstico feroz se submetido a testes num ambiente controlado. Num ambiente normal já foi o que se viu. Do segundo miúdo, mais velho um mês, também lhe ouvimos uns murmúrios. Dependente da mãe, birrento e muito pouco sociável numa tarde inteira de brincadeiras. Da imaginação a brincar nem se fala. O meu filho encosta-o a um canto, apenas no exercício simples de pôr os bonecos a dialogar. Sei que sou suspeita mas apraz-me dizer duas coisas: a primeira é que fiquei muito surpreendida e ainda mais convicta no orgulho que tenho no meu filho, por estar a batalhar para ultrapassar um atraso no desenvolvimento; a segunda é aconselhar certos cientistas da mente a redefenirem o conceito de PEA. É que entre estes três meninos, o meu filho era o único que não parecia autista. Ao ponto de as mamãs dos respectivos terem dito que o meu filho estava muito desenvolvido.

8 comentários:

Mrs_Noris disse...

Olá Isa,
Por cá já notei o mesmo. Tenho um colega com um filho de 8 anos e sempre que os encontro na rua o miúdo só falta fugir de mim. Quando nos vê esconde-se carrancudo atrás das pernas do pai, e assim fica sem dizer uma palavra, respondendo após muita insistência com um abano de cabeça e com os olhos postos no chão (não sai nada ao pai, diga-se). E sei que não é só comigo que o faz. Já o meu filho não tem este tipo de comportamento. É mais do tipo sorridente, abusador e descontrolado.
Talvez seja reflexo do ritmo de vida que hoje levamos. As crianças e os pais têm pouco tempo livre. Desde muito pequenas são postas em infantários onde passam o dia e no pouco tempo que têm com a família na generalidade não brincam, não saltam, não correm, não jogam à bola,... Os pais têm pouco tempo para lhes dedicar, pertencem ao trabalho, à casa, aos problemas, às obrigações. E cada vez mais a electrónica "substitui" a atenção dos pais. Muitas crianças passam demasiado tempo, fechadas em apartamentos, em frente aos canais de televisão, às Play-Stations, GameBoy’s e afins. Para mim o comportamento de uma criança que passa horas presa a um monitor pouco difere do de uma criança com autismo.
Um beijo.

. disse...

Noris, ou propicia outras formas de autismo. De certa forma, e pegando num ponto positivo, a probabilidade de ter um filho com PEA serviu para retirar uma lição: o meu filho pode até ter traços autistas mas será um menino que não crescerá com saudade dos pais. É um miúdo bem disposto que espalha alegria por onde passa e esse é o meu maior conforto. Um beijo. Isa

Anônimo disse...

Cara Isa, não tenho dúvidas, desde que me expôs os sintomas do seu filho, que ele será, futuramente e na "pior" das hipóteses, um pouco excêntrico. As PEA's, até prova do contrário, estão a ser diagnosticadas como o era a peste bubónica há cinco séculos: um espirro banal dava lugar a irrevogável sentença de morte. Há muita gente - infelizmente - para quem pais preocupados são bons reforços mensais de receitas. Tudo de bom para si.

. disse...

Pai, em breve enviar-lhe-ei um email, pois não tenho conseguido comentá-lo como deve ser. Perdoe-me o abuso, mas sinto uma grande afinidade consigo, não me pergunte porquê. Revejo-me em muito do que sente e reflecte. Sobre as saídas, por exemplo, não imagina as vezes que me apetece não sair, protegê-lo, proteger-nos. Mas vou sempre, ou quase sempre. Com medo, é certo... Com medo se por algum motivo tiver de disfarçar alguma esquisitice. Mas só assim abro a porta a algumas surpresas e aprendo a gerir as desilusões. Um beijinho grande. Isa

Anônimo disse...

Cara Isa,
São reconfortantes esses momentos em que vemos que, afinal, os nossos meninos não são assim tão "diferentes".Eu também conheci e conheço crianças "horríveis" (Deus me perdoe!),embirrentas, mal-educadas ou muito pouco sociáveis.Os nosso filhos têm acima de tudo uma dose de atenção da nossa parte que as crianças ditas normais não têm e,por isso,não tenho dúvidas que desenvolverão melhor certas áreas do seu comportamento.
E sabe que mais?Aqui que ninguém nos ouve,neste momento estão no meu local de trabalho 3 criaturas adultas,2 do género masculino e 1 do feminino que são do mais rude,anti-social e mal-educados que conheci...e não são autistas!Perante isto e o proliferar de gente assim por todo o lado, já tenho dito ao meu marido que provavelmente o nosso filho vai até passar muito bem e ser visto pelos outros como muito bem educado!
Abreijos para todos aí em casa!:-)!

. disse...

Mariamartim, não faltam para aí protótipos desses. A minha mente fantasiosa até visualiza esse exército de adultos mal educados e solitários que o presente está a fabricar. Não deve ser coincidência que agora tantos meninos pareçam autistas. Um beijinho. Isa

Mel disse...

Olá Isa,
Parece que o seu menino está cada vez melhor! Fico muito feliz por isso. Penso, como o Pai do "trabalho de casa", que as implicações desta eventual perturbação no seu menino, no futuro, serão mínimas.
Sobre os seus comportamentos, de facto eu também acho que, em contacto com outras crianças, o meu não se porta pior do que os outros. Por vezes, pelo contrário, até se porta melhor. às vezes dou por mim a pensar se ele é que é o autista ou serão os outros. Por exemplo, nas férias fomos passar um fim-de-semana com um casal amigo que tem 2 filhos, uma menina de 8 anos, que o meu filho adora e que tem muita paciência para brincar com ele ( como ele tem 4, ela trata-o como o bébé, com muita atenção e carinho)e um menino com 5 anos. Ele grita imenso e chora por tudo e por nada quando não consegue aquilo que quer. Não suporta perder nos jogos e passa o tempo todo a fazer birras. A dada altura, o meu de 4 anos já se virava para ele e dizia-lhe "tem cama ( tem calma)" e lá lhe ia dando os brinquedos para ele parar de gritar. De facto, nesse periodo, a criança mais difícil acabou por ser o filho desses nossos amigos.
Um beijinho e que tudoo continue assim, em ascendente.
Maria Anjos

. disse...

Maria Anjos, não deixa de ser curioso. Dizem que os meninos com PEA têm baixíssima tolerância à frustração mas o que eu vejo é que há meninos bem piores. As birras do meu, quando tem sono ou quando se arrelia por não conseguir qualquer coisa, duram pouco e nunca são espalhafatosas. Nunca se atirou para o chão, a morder e a dar cabeçadas e só espero que assim continue. Um beijo. Isa