domingo, 11 de maio de 2008

Attwood

Ler o livro "A Síndrome de Asperger" foi, para mim, uma experiência avassaladora. Li-o em poucas horas. Mesmo sabendo alguma coisa sobre o problema, não tinha ainda a percepção da dimensão que o desencaixe dos SA pode tomar. A primeira coisa que consigo perguntar é: ensinar-lhes como reagir, falar, ser, chorar, etc, não implica que lhes estejamos a impingir aquilo que nós somos, anulando a sua individualidade? O facto de não saberem pôr em prática a sua forma de ser, não quer dizer que não a tenham. Até que ponto ensiná-los até a decorar o que dizer em determinadas circunstâncias lhes aponta uma vida mais normalizada? Como se sentirão ao serem programados? Bem, mal? Attwood fala de uma "cura" social a partir dos 30 anos, altura em que os SA já não se preocupam tanto em ser diferentes e também se diluem mais facilmente em sociedade, mas, e até lá? Será mesmo assim? A cura para os SA é guiá-los pela vida e pela complexidade social, mas nunca lhes evitaremos o sofrimento de "não ser". Nunca se lhes tirará o peso atroz de nascer e viver num mundo que não entendem, com gente que não entendem. Por mais que façamos, nunca conseguiremos prever tudo e ensinar-lhes tudo. Não é sequer esse o objectivo. A meta é minimizar o impacto, automatizá-los. Porque não um chip cerebral?

19 comentários:

Mrs_Noris disse...

Nós é que temos a prática. Penso que a "cura" passa antes por explicar-lhes as coisas na ocasião certa, mais do que treiná-los, como cães!
Um beijo.

. disse...

Noris, não é que discorde, entendes? Mas faz-me impressão que tenha que ser assim. Nós, os pais, é que temos que aplicar a soluções com peso e medida. É como dizes, eles não são cães. Nem papéis em branco onde possamos escrever os guiões das suas vidas. Isa

Estrunfina disse...

Tenho pensado ultimamente naquele célebre texto "Não chorem por nós". Quando o li pela primeira vez, achei que era um disparate, o autismo para mim estava mesmo a ser uma tragédia.
Continuo a ter muitos dias e fases más mas já não o acho descabido. Aceitar o autismo é também aceitar que não existe uma cura.

A Cathy não é Asperger, será talvez mais difícil para ela aprender algumas competências sociais mas o que eu desejo é que ela seja capaz de lidar com a diferença e explicar-lhes por ex. que é suposto cumprimentar as pessoas quando chegamos a um sítio. Isto não tem nada a ver com treinar cães. Todos nós fomos ensinados dessa maneira e às vezes não me apetece falar às pessoas mas faço-o e nem por isso acho que estou a ir contra a minha natureza.

Eles provavelmente vão ter de fazer mais fretes" que todas nós juntas.

Bjs,
Andreia

Anônimo disse...

Cara Isa,
Essa foi a sensação com que saí da conferência...fez-se luz, compreendi:eles são diferentes, nunca vão ser iguais, podemos ensinar-lhes a melhor "encaixar" mas a "cura" não existe, apenas o encaixar melhor ou o parecer que encaixam melhor.
E, principalmente, o convívio diário com o meu filho deixa-me perplexa...como é que esta criança com grande capacidade intelectual passa o Domingo a falar com a t.v.??? Como é que não consegue saber quando é dia 21 e tem um passeio de BTT??? Pior ainda, quando for dia 20 se ninguém lhe disser ele sai de casa no outro dia como se fosse um dia normal de escola???
Pois é...o meu sabe muito bem explicar a procriação em termos biológicos,já perguntou foi como é que a semente do pai dele foi parar à barriga da mãe se não se sabe onde o pai dele está...? Curioso, não é? É que com as suas dificuldades temporais, ele não raciocina sobre o assunto passado há mais de 10 anos quando foi gerado...Nem consegue perceber que nessa altura se sabia onde o pai estava, a viver com a mãe dele...
Tudo isto é mais confuso para eles do que a explicação do fenómeno biológico.
Estrumpfina, já fui espreitar o seu cantinho...com tempo, deixarei por lá um comentário!
Beijos!

Mina disse...

Não conheço o livro,nem fui há confêrencia.
Mas da minha experiencia pessoal, não somos nós que colocamos o chip, mas eles irão cria-lo,vão tê-lo super cheio com as coisas, mais superfluas. Ás vezes parece-me que tem imensas peças soltas,conseguem ter nesse chip tanta matéria que foram acumulando ao longo dos anos, e parece que não a vão apagando dos registos. Mas na prática não conseguem fazer as coisas mais banais, como apertar um atacador, utilizar o talher convenientemente,reparar como estão vestidos,camisola para fora camisola dentro...
Acho que devem treina-los para autonomia, não como cães, mas é importante, embora eles sejam pequenos é mais fácil começarem a criar essas rotinas.
Nós como mães galinhas queremos sempre proteger os nossos pintos, e ás vezes não estamos a ajudar.
Se eu tivesse tido estas informações há 20 anos ,secalhar teria agido de outra forma no treino autonomia,só que na altura o meu filho até era sob-dotado.
Os livros dão-nos indicações, mas a vida dá-nos lições.
Vivam um dia de cada vez e decerto, a intuição, vos ajudará...
Bjocas

Mina disse...

Ah... vou esperar pelo 30anos.
Já estou avançada (lol)
Depois digo-vos (lol)
Bjocas

. disse...

Estrumpfina, leste o livro? Ajudá-los é uma coisa, "programá-los" é outra. Não se pode andar para aí a dizer que eles são puros e maravilhosos e depois ter como missão destrui-los. Isto sou eu a reflectir, não busco o aval de ninguém. O autismo é um pesadelo porque os faz sofrer, ponto final. E isso é algo que me atormenta nos meus dias não, dias a que também tenho direito no meio dos tantos em que me sinto bem. Eu não quero outro filho, mas saber que sofrerá nunca vou conseguir esquecer ou minimizar. Sofresse eu antes. Isa

. disse...

Mariamartim, que voltas dá o cérebro para que não sejam capazes de viver em sociedade? Que partes estarão desligadas? Este fim de semana lá andei mais sensível e olho para ele, tão lindo, e juro que não consigo compreender certos desígnios. Haja fé e amor. Isa

. disse...

Mina, o livro vale a pena. Mas é assustador, de certa forma. Porque pretende que se lhes ensine a representar, através de sketches da vida diária. Se me acontecer isto, faço isto e aquilo, digo aqueloutro e ponho o sorriso y. Não é isso que eu quero para o meu filho. Quero que o meu filho seja ele, não uma fraude. Posso até dar-lhe dicas sobre como agir, mas tentarei que se aceite tal como for. Porque entre ser um actor frustrado e um asperger consciente da sua situação, prefiro a última opção. Quando o bruno chegar aos 30, diz qualquer coisa. :) Isa

Mrs_Noris disse...

Concordo que não devem ser programados. As cenas da vida diária acontecem-nos a nós e devemos aproveitar as situações concretas para fazê-los entender as coisas, aprender a colocar-se no lugar do outro, o que é diferente de programá-los.
Aqui há dias a minha cunha "abanou a mosca", como tu dizes, ao meu sobrinho, que se pôs logo a chorar. O meu filho assistiu à cena meio ao longe e começou a rir-se. Fui logo ao pé dele e perguntei: Gostavas que o Nuno se risse quando tu estás a chorar? Ao que ele respondeu logo "Não!".
"E então porque é que te estás a rir? Vai mas é dar um abraço ao primo, que ele precisa porque está triste."
Claro que ignorou a segunda parte da recomendação, mas parou logo com aquele risinho tolo.
Um beijo a todas.

Estrunfina disse...

Isa,

Não li o livro.

A Cathy não é daquelas meninas que parece infeliz (sei que há casos assim). Antes pelo contrário, é uma menina muito alegre, com uma cara muito expressiva.

Acho que o sofrimento que por vezes ela sente tem a ver precisamente com o facto de ela não conseguir transmitir o que quer dizer e fica frustada.

É por isso que eu acho que quando ela conseguir falar mais, o problema se vai atenuar bastante. E o autismo que estará sempre presente passará a ter menos influência no dia a dia.

. disse...

Mrs Noris, é esse o caminho, mesmo! Tentar com que se ponham na pele dos outros. :)

Estrumpfina, nenhum dos nossos filhos é infeliz. Muito pelo contrário. São meninos enérgicos e alegres, inoncentes, que irradiam felicidade, ainda que com as suas birras normais. A questão não está no "agora", mas no depois, quando se aperceberem do seu problema. Até te aconselhava a ler o livro, mas deixo ao teu critério. Ajuda, mas dá-nos uma realidade algo assustadora. Enfim. A vida é assim mesmo.

Isa

Grilinha disse...

O nome do Livro é Attwood ?
Como não estou dentro do problema não conheço. Sou uma apaixonada pelo cérebro, as crianças e adorava lê-lo... Encontro-o na Fnac ?
Beijo

Mel disse...

Programa-los também não me parece. Agora ensina-los a adequarem-se aquilo que é esperado nas relações sociais, parece-me fundamental. Quantos de nós fazemos só aquilo que queremos no nosso dia-a-dia? Por vezes não temos que fazer o sorriso X ou Y e responder com a maior da polidez possível, qd nos apeteceria precisamente o contrario? Mas são as regras da convivência social e eles só terão a ganhar se souberem lidar com elas. Contudo, por vezes pergunto-me se valerá a pena investir tanto na socialização do pequeno, quando no nosso dia-a-dia lidamos com gente tão mal educada, quando nos pedem que olhemos a metas numéricas, quantificáveis, qd os valores humanos de ajuda e solidariedade vão sendo apenas palvras bonitas que se dizem nas ocasiões para plateia ouvir. Nessas alturas pergunto-me de facto se, no fundo, não pretendem que no futuro seja-mos todos um pouco autistas ( hoje estou rabugenta e deu-me para aqui!).
Beijinhos a todos
Maria Anjos

Anônimo disse...

Grilinha, o nome é a Síndrome de Asperger, de Tony Attwood. Na FNAC deve haver.

Maria Anjos, concordo contigo, sabes? Tb nós somos treinados para isso, mas por isso somos sempre um pouco vítimas desta sociedade fingida e muitas vezes hipócrita. Vamos ajudá-los, mas preservando um pouco da sua pureza, para que não lhes destruamos a essência por completo. Um xi coração de rabugenta para rabugenta. Isa

. disse...

Grilinha, esqueci-me dos teus beijinhos. rss rssss. Isa

Grilinha disse...

Obrigado.
Vou dar uma espreitadela no livro.

Não quis dar grande opinião porque tenho uma ideia formada, mas que no contexto do S.A deve estar bastante desfasada.

Acho que lhes devemos ensinar algumas boas maneiras e regras sociais habituais, (o obrigado, o se faz favor, etc) e não é questão de lhes tirar a esponteaneadade...mas de ensinar. Terão o resto da vida para fazer o que querem e não o que lhes foi ensinado, mas em crianças devem obedecer. Quanto a mim, talvez sirva para todos.
Se pensarmos que todas as crianças são parecidas, mesmo que sejam diferentes, se calhar estamos a tentar automatizá-los, mas também estamos a ensinar algumas regras de convivência que podemos ou não usar .
E já agora beijinhos tb para ti, ehehe.

. disse...

Grilinha, se fosse ensinar-lhes regras sociais eu não ficava chocada. O livro quer que a gente simule várias cenas da vida para lhes ensinarmos o que fazer e dizer. Só que aquilo que eu diria se me pisassem um pé na rua ou se metessem conversa comigo numa fila de hipermercado é da minha cabeça e do meu feitio e personalidade. Treinar o meu filho com frases minhas não é ensiná-lo a ser ele mesmo mas a ser um actor. Aqui não se trata do "deves fazer isto" e "não deves fazer aquilo". É ensinar-lhes o que dizer, onde pôr as mãos e até que cara devem fazer. Não me agrada, mas vou fazê-lo se tiver mesmo que ser. Mas vou fazê-lo de forma a que ele não desapareça, engolido pela minha maneira de ser e de outros que ele vá imitando para sobreviver. Lê o livro. Depois vais perceber os meus receios. Isa

Grilinha disse...

oK. Já andei a desfolhá-lo. Da próxima compro.
Segue muito o teu coração...muito mais do que indicações...

Beijos