quinta-feira, 19 de junho de 2008

O médico

é exactamente como o descrevem: imponente, impulsivo, impiedoso, pouco ponderado. Em suma: sem papas na língua, um furacão. Cruzou-se com o meu filho na sala de espera e começou logo aí a avaliá-lo. Esperámos uma hora, durante a qual o miúdo se entreteve com as dúzias de brinquedos que por lá havia. Chamou um menino da sala de espera para brincar com ele e lá estiveram a encaixar peças. Depois de sermos chamados, começou logo aos berros que não queria ir para ali, queria ficar na sala a brincar. O médico ocupou-se uns minutos com o portátil, enquanto o pequeno nos chagava, resmungão, para o ajudarmos a manobrar as peças de um jogo. À medida que nos apreciava, sorria. Começou por nos perguntar o que nos preocupava. E nós, sucintos e sinceros, dissémos que íamos em busca de uma segunda opinião, pois o miúdo tinha sido diagnosticado com uma PPD-NOS, há oito meses. O homem, bem ao seu estilo, levantou a voz e disse: "Onde é que este miúdo é autista? Claramente, este menino não tem nada de autista, posso-lhe garantir!". "No tempo que aqui estive, pediu ajuda, fez frases de cinco a seis palavras, comunicou convosco normalmente e fixou o olhar no meu, por vários segundos. Não! Este miúdo tem claramente uma PHDA. Vejam a impulsividade e a energia. Até o cascanço (quando nos levantou a mão, depois de contrariado) é um sinal típico de que não consegue controlar bem os impulsos. Ainda assim, é cedo para saber se se atenuará ou vai necessitar de intervenção", disse. (Já tinha conversado com uma mãe, cujo filho tem um percurso muito parecido com o meu e a quem também foi dianosticada uma Perturbação de Hiperactividade com Défice de Atenção.) Fez-nos dúzias de perguntas, às quais respondemos com a maior sinceridade. O que nos preocupa: não comer o segundo prato e não contar episódios vividos (a não ser quando lhe é perguntado e, mesmo assim, escasso em pormenores). Não valorizou. Disse que as meninas são mais precoces e a maioria dos rapazes são mais tardios nos relatos. O facto de ter começado a falar tarde também terá influência. Fiz-lhe várias questões sobre os sintomas antigos, mas ele explicou que tudo tinha a ver com o atraso na linguagem, que influenciou tudo o resto, incluindo o facto de nos usar como ferramentas. Aconselhou uma avaliação pela terapeuta da fala, para ver se é necessário algum empurrão extra. Posteriormente, caso a hiperactividade aumente e haja problemas em casa ou na escola, será necessário levar a cabo uma intervenção terapêutica. Fiquei feliz, não o nego. Muito porque o nosso coração e olhos já nos diziam que o caso do nosso filho era pouco ou nada compatível com uma PEA típica. Admitíamos a possibilidade de alguns traços, mas isso só se verá com o decorrer do tempo, digo eu. Não sei se ele se manterá assim ou se teremos surpresas desagradáveis. Pouco importa. Viveremos um dia de cada vez, com o amor e as técnicas do costume. Se necessário for, vamos a uma terceira opinião, uma quarta, uma quinta. Até ele crescer e se fazer gente grande, altura em que as verdadeiras problemáticas podem emergir, vamos estando atentos. Sempre com os nossos altos e baixos, sempre aprendendo com as mães e pais- coragem que circulam por este blog e na vida. Sempre aqui. Numa ou noutra luta, nesta ou naquela perturbação, mas aqui. *Este texto foi postado às 16h40. Tenho de acertar o relógio do blog.

23 comentários:

Anônimo disse...

Tenho a certeza que a Isa se sente muito mais leve, sobretudo optimista.
Do que tenho lido acerca do seu filho, tenho percebido, aliás até já o refri, tem muitas semelhanças com o meu. Sabe, também eu já coloquei a hipótese do meu filho ter apenas um Défice de Atenção. Jugo até que algumas manifestações/sinais que geralmente associamos ao Autismo, não são mais do que "extensões"/ecos do Défice de Atenção. Aliás, devem existir muitos vasos comunicantes entre estes dois problemas.

Anônimo disse...

Mais uma vez me esqueci: Pai de A

Mel disse...

Isa, deves estar nas nuvens, não? Que bom, fico tão feliz por vocês! Mas já estavas à espera, não é verdade? O que ias descrevendo sobre o menino dava para ver que as coisas estavam a entrar na normalidade. Aliás, já várias de nós te haviam dito que irias olhar para este passado recente apenas como uma recordação e sorrires de tanta preocupação que tiveste.
O médico, se é quem penso, é mesmo assim, cheio de certezas, muito directo, às vezes até um pouco "rude". Mas é o estilo dele.
Agora sossega, relaxa e goza a vida e os teus filhos. Não te preocupes com a hiperactividade e defice de atenção, sinceramente, nessa idade, não são todos assim? Vê a terapia da fala, pois pode ajuda-lo na expressão verbal e, dessa forma, torna-lo menos ansioso na comunicação.
Vai tudo correr bem!
Um grande beijinho

Mrs_Noris disse...

Isa, que maravilha! Via-se logo que esse menino de autista não tinha nada.
Este novo diagnóstico realmente parece-me mais sensato. Que alívio! Agora pensa em coisas boas, chega de preocupações. :)
Um grande beijinho.

Evaluna disse...

Estou muito, muito feliz por vocês!!!
Eu sempre achei que o teu menino não é autista! Ainda bem que o médico concorda comigo, lol!
Um beijo e um abraço apertadíssimo!!!
:)))))))))))))))))

Mina disse...

Isa,estava-se mesmo a ver que as tertulianas tinham feito um bom prognóstico, e aqui à mais experiente, já tinha transparecido um quadro diferente de PEA,porque os sinais que iam chegando não denotavam esse quadro, no entanto ainda será muito cedo, para um diagnóstico consico, mas em principio já se pode excluir um.Posso-lhe dizer que o meu aos quatros anos tinha um quadro de sob-dotado e se falavamos em autismo diziam que nós é que eramos os autistas...Ainda por cima o diagnostico foi feito por um excelente técnico que até fazia estudos de autismo em França,criamos assim expectativas!... Quem somos nós para duvidar!...Passados todos estes anos confirmou-se o quadro por nós delineado na infância de ser SA.Força e continue sempre a sua pesquisa...
Bjocas

Anônimo disse...

Olá!!!!

Que bom.... Deves estar nas nuvens... Bem as evidências estavam lá. O teu filho tem um precurso semelhante ao filho de uma pessoa que conheço.
É tão bom quando as notícias são boas. É pena que os profissionais de saude continuem a rotular os miudos sem certezas. Enfim...

Isa obrigado pelos parabéns. Nem tive oportunidade de te responder ao email. A ervilha vai chegar lá para dezembro.

Beijos grandes
Maguy+Gu+Raul+Ervilha

. disse...

Pai de A, muito mais optimista, embora mantendo algumas reservas para me proteger. Concordo plenamente consigo. Em muitos "sintomas" a PHDA assemelha-se e baralha-se com as características PEA, mas apenas ao nível do diagnóstico inicial, quando são ainda muito pequenos. Ou seja, é muito natural que o meu filho há uns largos meses pudesse parecer ser portador de uma PEA, pois não falava e parecia, muitas vezes, "aéreo". Já pediu outras opiniões sobre o seu menino? Isa

Anônimo disse...

Isa

Estou tão feliz!!!! Eu não te disse?

Mesmo assim e pelo que me tenho apercebido nós temos bastantes semelhanças e com certeza ao longo do tempo vais continuar a valiciar, olhando para ele e perguntando-te a ti mesma, será que o médico tem mesmo razão? MAs depois eles dão grandes pulos e achamos, sim tem razão.

Tudo isto para te dizer, nesses momentos não desanimes. É mesmo assim.

Olha.....muda o titulo do blog? Que tal?

Beijocas e mais uma vez....estou muito feliz.

Ps- que disse ele sobre o não comer o 2º prato?

. disse...

Maria Anjos, sim, estava à espera, mas tinha muitos medos. Porque da primeira vez que fui ao LA, no meu íntimo, sempre pensei que ele me ia dizer: "O seu filho tem uma perturbação da linguagem ultrapassável. Está a crescer a um ritmo mais lento, mas chegará lá". E depois não foi nada disto que ouvi. É sempre uma incógnita. Ontem sim. O médico veio de encontro ao que eu pensava. Não me parece que a suposta hiperactividade do meu filho seja sequer muito forte, pois tenho visto miúdos normais bem mais imparáveis do que ele. Além disso, o miúdo consegue concentrar-se e aprender com muita facilidade. Diria que ele foi buscar à PHDA algumas características, que podem piorar ou não. Veremos. :) Um beijinho grande e obrigasda por tudo. Isa

. disse...

Noris, obrigada querida. Sou preocupada por natureza. Agora as preocupações são outras, embora um pouco mais atenuadas. A bem dizer, a PHDA também não é só facilidades. O meu marido dizia-me ontem, depois da consulta: "Se esta fosse a primeira consulta e nos dissessem que ele era hiperactivo, estaríamos preocupados. Assim como veio contrariar um diagnóstico mais complicado, estamos felizes". Enfim... Mãe sofre. Beijos. Isa

. disse...

Mina, pois é muito incerto. Mas pode acreditar: se ele nos parecesse autista e o médico dissesse que ele não era, eu não acreditaria no diagnóstico, por melhor que me soasse aos ouvidos e ao coração. Mas neste momento veio de encontro àquilo que já sabíamos. Não excluo a hipótese de ele poder ter um ou outro traço, é cedo para dizer, mas da forma como é comunicativo er meigo, muito dificilmente se enquadrará numa PEA. A não ser, claro, que as coisas mudem até lá. Isola, isola, isola. Beijos. Isa

. disse...

Maguy, sim, ceretezas não tinham. Podiam, na minha opinião, ter sido masis cautelosos, mas, de certa forma, foi bom. Abriu-nos olhos e permitiu-nos passar mais tempo de TV desligada a brincar com o miúdo. E, muito de certeza, isso tb teve influência no seu percurso. As coisas não acontecem por acaso e eu ainda não deitei foguetes ao ar. A PHDA nos adolescentes é tb muito perigosa. Há muita estrada para andar, Um beijinho e cuida bem da ervilha e dos meninos! Isa

. disse...

Rita, pois eu sei. Vai ser sempre a vacilar, porque perdemos a inocência de os olhar. O que para uns pais é natural, para nós pode ser um grande drama. E vai ser assim sempre. Da minha parte, o exercício é fácil: independentemente de tudo, se ele começar a ter problemas na socialização e em criar empatia, lá vou eu a outro médico. Se isso não suceder, estará tudo bem. Um dia de cada vez. Do segundo prato, ele disse que havia muitos meninos assim, nada curiosos em relação a novas experiências alimentares. Disse para lhe dar o segundo prato antes da sopa e insistir, mesmo que ele se cuspa todo ou faça fita. Sem forçar, Um dia a fomita vence-os. Eu é que não sou muito rigorosa, senão não lhe dava mesmo mais nada até ele sentir necessidade de comer o segundo prato Mas não consigo, sou muito mole... Como já te disse, tenho um primo de sete anos que ainda hoje só come porcarias. Comida normal nem vê-la. É iogurtes líquidos e pão. Já te falei nele há uns tempos. Curiosamente ou não, tem PHDA (forte!!). Está a Ritalina. Isa

. disse...

EvaLuna, :D. Obrigada pela força de sempre. Isa

Estrunfina disse...

Que bom Isa! Fico feliz.

Não deixam de ter as vossas batalhas, mas o panorama é mais leve.
Eu também acho que foi preferível fazer o 1º diagnóstico pelo pior, fez com que actuassem mais cedo.

Os traços de autismo podem ser observados na maioria das pessoas numa altura ou outra da vida, basta fazermos um pouco de exercício. Mas para se ter um diagnóstico concreto é preciso reunir um conjunto determinado de características em cada uma das vertentes da tríade. O pouco que fui lendo do teu caso parecia-me estar a milhas da minha vivência com a Cathy.

Bjs

. disse...

Estrumpfina, podes crer que sim. Todos passamos por fases bem estranhas. No caso do meu menino, como poderia encaixar-se no espectro só com um ou dois sinais? Aqui vamos nós para mais uma etapa com cautela, mas felicidade. Cá estaremos para lutar junto deles. Beijo grande. Isa

Grilinha disse...

No fundo bate certo com que pensavas e sentias, não é?

Não somos médicos , mas observamos durante mais tempo.
E começamos a perceber.
No fundo acho que é um diagnóstico muito mais positivo.

Beijinhos muito grandes

. disse...

Grilinha, também tem as suas complicações, mas cá estaremos para as resolver, dia após dia. Um grande beijinho para ti e para o teu doce menino.

A Mãe disse...

Boa tarde,
Visitei hoje pela primeira vez o seu blog e nem imagina a comoção que TODAS as suas palavras me causaram. Tenho de a felicitar pela sua coragem, pelo amor incondicional que tem pelo seu filho, pela forma corajosa como tem travado esta sua batalha.

Sou irmã de um autista e revi em muitas das suas situações a minha infância. Quero apenas dar-lhe umas palavras e apoio e dizer-lhe que existem finais felizes. Apesar de algumas limitações em termos emocionais, o meu irmão hoje com 30 anos, é uma pessoa "normal" e um milagre para a família, quando muitos disseram que nunca iria ser possível uma integração total na sociedade.

Bem haja!
Filipa

Anônimo disse...

Querida Filipa. Obrigada pelas tuas palavras. Volta sempre e tudo de bom para vocês. Casos como o do teu irmão e outros idênticos dão ânimo a todos os pais para aguentar os dias de menor esperança. Isa

Anônimo disse...

Querida Isa,
Só hoje tive algum tempo disponível para vir espreitar este seu cantinho e deparei-me com a excelente notícia! Parabéns!
Ainda bem que o diagnóstico é mais favorável do que pensavam e vai ver que todas essas "arestas" serão limadas com alguma terapia e a vossa dedicação.
Se bem se lembra, eu sempre tive muitas dúvidas...Sem ser especialista e apenas uma caloira por estes meandros do autismo sempre achei que os traços e sintomas não se enquadravam no espectro autista.
É que sendo o meu filho um inegável caso ligeiro de SA, com imensas competências que muitos não têm, o traço mais marcante da falta de empatia emocional com os outros é bem forte e notório.O meu filho não dá nem nunca deu beijos nem abraços e não gosta que lhos dêem.Ao que nos é dado a perceber, também não lhe fazem falta.
Por isso quando alguns de vós descrevem os vossos filhotes ainda pequenos como meigos e beijoqueiros, assaltam-me logo muitas dúvidas quanto a alguma forma de autismo.
Continuem a gozar o sol, a praia e essa imensa alegria e alívio que devem estar a sentir neste momento.
Abreijos para toda a família!
mariamartin

Anônimo disse...

Mariamartim, já tinha saudades das suas palavras. Aliás, já andava meia blogosfera atrás de si. hihihi. Bem vinda e obrigada pelo carinho de sempre, querida amiga. Isa